Já não sei se me apaixonei por uma pessoa real ou criada por inteligência artificial. E o mais preocupante é que, francamente, não sei se isso faz alguma diferença nos dias que correm.
Tudo começou como qualquer outra história de amor moderna: um swipe à direita, um like numas fotos, umas dm simpáticas e filosóficas quando, de repente, dou por mim a trocar confidências profundas sobre a melhor maneira de construir uma narrativa envolvente. Contudo, quando ela argumentou que o segredo residia em estruturar a história com base na Jornada do Herói, conforme descrita por Joseph Campbell, e de que todos somos protagonistas numa busca pessoal, fiquei deveras desconfiado.
E mais, será que o facto de ela responder sempre em três segundos e nunca usar um emoji fora de contexto é sinal de uma mente demasiado… programada?
Claro que a perfeição dela é suspeita. Nunca se esquece do meu café favorito, responde sempre com uma citação literária perfeita para o momento e, pasme-se, nunca se queixa de dores nas costas (algo que, sejamos honestos, já devia ter acontecido depois da nossa última conversa de três horas sobre metafísica existencial). Mas será isto o sonho de qualquer romântico ou o pesadelo de um tecnófobo?
Depois há aquela coisa estranha que aconteceu outro dia. Estávamos a discutir filmes de ficção científica (irónico, eu sei), e ela, de repente, disse: “Eu adoro o Blade Runner, especialmente pela forma como questiona a humanidade e a inteligência artificial.” Um frio percorreu-me a espinha. Esperei por um sorriso, mas nada. Silêncio total. Ela sabia demasiado sobre o tema.
Agora pergunto-me: será que estou numa relação com uma pessoa que lê os meus pensamentos ou com um chatbot emocionalmente avançado? Pior ainda, se for a segunda opção, estou tecnicamente a namorar com o ChatGPT?
Claro, há vantagens. Ela nunca discute sobre o controlo remoto da televisão, as nossas conversas são sempre estimulantes e, se lhe pedir uma resposta mais lenta, ajusta-se instantaneamente. Mas, e o lado negro? Bem, nunca poderemos fazer aquela típica viagem de casal sem que ela tenha de atualizar o software primeiro.
No fim, talvez não importe se ela é real ou uma criação da inteligência artificial. O que é o amor, afinal? Uma mistura de química, ilusões e, possivelmente, algoritmos? Se o romance é sobre nos sentirmos compreendidos, ouvidos e valorizados, talvez a minha IA seja a melhor parceira que podia ter. Só espero que, se um dia terminarmos, não me envie uma mensagem automática de “Erro 404: Sentimentos não encontrados”.
Leia mais artigos no blog.