Como pais, professores e tutores temos por vezes a mania de que somos os melhores conselheiros. Atrevo-me mesmo a dizer que julgamos nascer com poderes sobrenaturais a este respeito.
Se existe o super-homem que salva pessoas de andares em chamas também tem de existir, algures, o super-conselheiro da leitura. Uma espécie de pai ou mãe camuflado de bibliotecário, psicoterapeuta, professor….. enfim… uma “soma de todas as áreas da aprendizagem”.
Já devem estar a dizer… mas um pai sabe muito bem o que faz. Se existe alguém que tem de estar em todas é o pai, a mãe, a avó, o avô, a tia, o tio, etc.
Como pai, penso exactamente o contrário. “Há cenas” (como diz o meu filho) que tenho mesmo de “saltar fora” (como me volta a dizer o meu filho). Ou seja, há momentos em que estou a mais! Não, não me custa estar a mais numa ou noutra situações.
Custar-me-ia era saber que a maioria das decisões que o meu filho toma fá-lo tendo, unicamente, em consideração o que eu acho, penso e…. julgo.
Na leitura o processo acontece da mesma forma. Tudo é uma questão de decisão: o que ler, como ler, quando ler, ler para quê… Tudo se resume a uma decisão! A um acto de entrega e de coragem!
Todos sabemos que a leitura nos torna maiores e que o facto de os nossos filhos terem hábitos de leitura os tornará mais aptos a um crescimento sustentável. Estamos todos de acordo nesta questão.
Partilharei convosco mais à frente 3 passos que podem seguir de forma a preparar o terreno para a criação de hábitos de leitura nos vossos filhos. Mas primeiro quero partilhar uma história que aconteceu comigo e que tudo tem a ver com os 3 passos dos quais falarei mais adiante.
Então reza assim…
Como pai passo por inúmeros desafios, nomeadamente ao nível da leitura. Como diz o ditado popular: “em casa de ferreiro espeto de pau”. Não gosto muito de frases pré-definidas mas confesso que por vezes vi-me (e vejo-me) “aflito” para contradizer esse ditado. Até que um dia aconteceu algo.
O meu filho de 8 anos tem hábitos de leitura temporários. Ou seja, lê durante um período e depois pára. A isto chamo de “leitura por elástico”. Este tipo de abordagem implica uma leitura intensiva/ compulsiva sobre algo durante um determinado tempo. Os jovens utilizam muito esta tipologia.
É como se o fizesse unicamente nos momentos em que sente necessidade. Para mim está óptimo dado que, quando o faz, sei que usufrui da leitura e que tem a capacidade de aplicar o que lê.
Aos hábitos devem estar associados padrões. Caso não haja padrão a facilidade em perder o hábito é grande. Com receio que ele perdesse o padrão que a pouco e pouco ia conquistando resolvi abordar a situação de outra forma.
Foi ao aplicar outra perspectiva que comecei a reparar em pormenores que antes não via. Observei que ele “passava” grande parte do tempo a cantar músicas do D8 (hip hop). Cantava tanto que chegava a construir letras suas. Pois é, a vida estava a presentear-me com uma enorme oportunidade e eu nem tinha reparado… Mais, o que lhe incentivava a ler estava completamente fora de contexto.
As letras das músicas estão, habitualmente, em verso e em rimas.
A forma como ele cantava demonstrava que ele se apropriava e integrava o que lia. Assim, se quisesse orientá-lo na leitura teria de o fazer através da poesia, dado que é este género que mais se aproxima da música que ele incessantemente cantava.
Após ter trazido um livro de poesia da biblioteca tive a certeza de que era mesmo de poesia que ele precisava! BINGO!
Mas queria aproveitar esta oportunidade de forma mais profunda. Foi através da problematização desta questão que criei o modelo dos 3 passos para a integração da leitura.
Estes 3 passos ajudaram-me muito no reforçar dos hábitos de leitura no meu filho e espero que façam sentido para ti.
Primeiro passo: ouve o teu filho
O teu filho tem centros de interesse bem próprios. Contudo, muitas vezes o verdadeiro interesse está nos pormenores das suas acções. Repara bem nas suas conversas, brincadeiras, decisões. Identifica o padrão. Ao captares o padrão terás acesso ao assunto da leitura que fará sentido ao teu filho nesse momento.
Segundo passo: identifica o género literário
Reconhece que género literário pode representar melhor o centro de interesse. Ao fazê-lo, o teu filho terá mais probabilidade em se identificar quer com a leitura, quer com a forma em que esta se apresenta. O género sustenta os contornos da obra. Assim, podemos dizer a mesma coisa mas de várias formas.
Terceiro passo: integrar a leitura nos 2 sentidos
– Sentido leitura –> pessoa: aplicar o que leu
Qualquer leitura tem uma aplicação prática na vida. A isto chamamos de impacto. Toma como exemplo quando o teu filho necessita ler um livropara realizar um trabalho para escola. O impacto de ele ter lido esse livro será, por exemplo, ter boa nota no trabalho.
– Sentido pessoa –> leitura: ler através de uma situação específica ou perspectiva
O que te proponho, além da primeira integração, é apostares na integração no sentido oposto. Motiva o teu filho a trazer partes da sua vida e/ou imaginário para dentro da obra. Ou seja, ler tendo essa consciência. Ao promoveres esta decisão estás a dar-lhe todo o à vontade para se apropriar da leitura e criar um processo de identificação de dentro para fora. Isto é, levar todo o contexto interno dele para dentro da obra. Podes por exemplo, pegar numa situação específica (brincadeira; um hábito; etc.) da vida dele e aplicares a um capítulo, a um conto. O meu filho optou por criar uma letra nova, baseada numa situação que estava a passar na escola, para uma música.
A vida está repleta de sinais que nos guiam e que nos transmitem qualquer coisa de inovador. A leitura facilita a sua percepção, compreensão e, por consequência, o nosso crescimento pessoal.
Cada um de nós nasce com um potencial incrível dentro de si. Mas é a forma como nos lemos e agimos que determina até que ponto esse mesmo potencial é utilizado.